Minha casa parecia diferente. Eram os mesmos tons de tinta nas paredes e calhas, as mesmas plantas no jardim e a antiga bicicleta de Marry continuava jogada ao lado do vaso de orquídeas. Porém, ficar quase um mês no hospital me fez sentir uma saudade enorme de cada canto da minha casa, até mesmo do cheiro de pinheiro e da visão dos orvalhos durante as neblinas da madrugada.
         Nathaniel tocou o meu ombro. Ele havia abandonado as atividades de representante para me ajudar na volta. Olhei em seus olhos, mais dourados que nunca diante o sol, dei dois passos e abri a porta. O metal da maçaneta,frio, em minha pele.
         A casa estava um pouco empoeirada, mas não chegava ao ponto de incomodar. O que realmente me chateava era a ausência de meus pais: Sempre trabalhando com seus inquestionáveis chefes, independente da situação na qual eu e Marry poderíamos nos encontrar. O bom disso é que aprendemos a nos virar sozinhas, e logo fui preparar algo para que eu e Nath possamos comer.
          A principio, Nathaniel relutou, dizendo que eu deveria estar de repouso, mas logo o convenci, alegando que ficar dias no hospital, deitada numa cama o dia e a noite toda já era repouso suficiente pra todo o resto da minha vida. Peguei massa, ovos e leite, acrescentei fermento, e preparei a massa de um bolo. Coloquei-o no forno.
         Nath estava sentado no sofá da sala, as costas escoradas nas almofadas turquesas, esticando a blusa sobre seu tronco e expondo o formato de suas omoplatas. Avisei-o que iria trocar de roupa. Não aguentava mais usar um conjunto branco de malha. Subi as escadas, ainda receosa sobre o que poderia encontrar no meu quarto.
          Abri a porta, me deparando com a sensação de saudade do único lugar inviolado, que até Marry sabia que não deveria entrar sem minha permissão. Sim, aquele era o único local no qual ninguém conseguira me atingir, já que até meu coração havia sido ferido. Kentin, Jade... Quem seria o próximo?
Me livrei dos desvaneios. Peguei uma blusa antiga no guarda roupa, vermelha e surrada, daquelas que vão até o joelho, coloquei um shortinho preto comum e desci. E não acreditei no que encontrei.
         Em menos de 10 minutos, que foi o tempo que levei para  ir ao meu quarto e voltar, Nath havia adormecido. A cena me comoveu. Sempre me visitava no hospital e deixou de viajar com a turma para poder me ajudar. Ás vezes, ficava até tarde da noite me esperando dormir e já estava acordado quando eu me levantava. Devia estar exausto. Mas o sofá não era tão confortável, então decidi levá-lo para a cama.
         - Nath, acorda. Você não pode dormir aqui.
         -Aahn! Desculpe, Em. Já vou me levantar e te ajudar a arrumar as coisas.- respondeu, bocejando e com os olhos piscantes.
         - Não é isso, Nath. O sofá é desconfortável, vêm, pode deitar na minha cama.
         - Na sua cama? Tem certeza?
         - Claro! Descansa um pouco enquanto eu faço a cobertura do bolo, e quando tudo estiver pronto eu te acordo. Agora vêm.
        Ajudei Nathaniel a se levantar, passando seus braços pelo meu ombro, e subimos as escadas. Deitei-o na minha cama, e vê-lo do lado dos meus ursinhos de pelúcia foi um tanto quanto engraçado. Dei-o um travesseiro e o encobri com um edredom azul. Ele dormiu novamente.
         O tempo passou e, com menos de duas horas, o bolo, a cobertura (com pedacinhos de morango que achei na geladeira) estavam prontos. Fiz suco de laranja, meu favorito. Olhei as horas e já eram quase sete da noite e eu não havia tomado banho ainda. O quarto de Marry e de meus pais estavam trancados, e já que Nath dormia no meu, resolvi usar o chuveiro do banheiro comum.
         A água caia sobre o meu corpo, quente e suave, em contraste com os meus pés, dançando ao toque da cerâmica fria. Meus cabelos, encharcados, grudaram-se contra minhas costas, alcançando até minha cintura. Tudo estava muito bem, mas a sensação vazia que tanto me perseguia anteriormente, me atingiu. Vejo Jade, indo embora, deixando tudo para trás. Sem motivo algum para fica ao invés de ir e me deixar. Penso em Ken, treinando exaustivamente para mudar, para poder superar o amor que sentia por mim e que eu não conseguia enxergar e perceber. Nath, me vigiando durante a noite, esforçando-se para se manter acordado para poder me ajudar caso eu necessitasse.
         Por que todos ao meu redor não podiam ficar apenas bem? Eu, definitivamente, era um imã de dor, ou pelo menos, decepção. Não só para os outros, mas também para mim mesma. Ser hipócrita o bastante por permitir Kentin se vingar de Ambre com aquele namoro falso. Tão obsessivo que, até hoje, estão juntos, e pelas noticias que recebi, felizes. Ser fraca por fugir quando Ken me ofendeu. Ser distraída a ponto de ser atropelada... Não, minha inimiga não é a Ambre.Sou eu mesma.
        Cai de joelhos, a água corrente contra minha nuca, sufocando as lágrimas que brotavam e escorriam. As faxas e bandagens estavam envolvidas por um plástico na altura da costela,para que a água não as danificasse. O vento frio que entrava pela janela me arrepiou. Já haviam se passando cerca de 20 minutos desde que entrei no chuveiro, ou seja, um banho consideravelmente demorado. Peguei minha toalha, sequei-me. E percebo que esqueci de pegar as roupas no meu guarda roupa.
         Bem, terei que ir ao meu quarto, pensei. Enrolo-me na toalha, e sorrateiramente, entro no meu quarto. E não há ninguém deitado na minha cama. UFA! Nath deve ter acordado e decido ir comer. Fecho a porta e desamarro a toalha, deixando-a cair no chão. Abro o guarda-roupa e opto em pegar um vestid...
         -Emery!- A voz de Nath surge, ambos surpresos. Me viro, e o encontro do outro lado do quarto, olhando-me nua, em pânico.-Desculpe, eu usei seu toalete e ouvi alguém fechando a porta e...- gaguejou.
          -FECHE OS OLHOS, NATHANIEL!- e me enrolei na toalha novamente. Quando estava coberta, disse-o: -Pode abrir agora.
           Nath me olhou, envergonhado. Tentou balbuciar desculpas mas o interrompi; -Está tudo bem,a culpa não é sua. Eu devia ter avisado. Vamos só esquecer isso, okay? - Ele balançou a cabeça e foi em direção a porta, ainda com o rosto bem vermelho.
          -AH!Nat, espere! Já que você está aqui, tem como prender o meu sutiã? É um pouco complicado e... Bem, uma ajudinha poderia ser util.
          - Ahn, okk, Em's.
           Virei-me de costas e abaixei a toalha, deixando-a cobrir apenas a minha cintura. Senti seus olhos nas minhas costas. Aos poucos, Nath se aproximou , e arrepiei quando, enquanto pegava o fecho, tocou minha pele e o curativo. Prendeu-o com rapidez, como se fosse simples tirar e por peças intimas.
          -Pronto- ele disse, mas não tirou as mãos de minhas costas. Deixou-as cair, escorregando até a minha cintura. - Emery... Em's..
         Seus dedos, firmes, porém com calos e judiados com o trabalho de representante, pegou meus cabelos e os deixaram de lado, abrindo espaço para que seu hálito doce e quente se chocasse contra o meu ombro. - Eme...- Nath sussurrou, mas foi interrompida, por uma voz, tão familiar quanto a minha própria.
          -Estou interrompendo, Emery?
         Nath se separou, com certeza, corando. Mas eu permaneci imóvel, o estômago contraído de pânico e saudade. Não possuía forças para me virar e encarar quem estava na porta.
          - Nem sequer mereço que olhe pra mim enquanto falo com você?- Disse, com o tom amargo, como se estivesse dominado por ódio e dor. Virei-me, sabendo que o verde de seus olhos, que se escureciam quando estavam em aflição, seria mais doloroso que um tapa ou ,até mesmo,facadas. Virei-me:
           -A quanto tempo.... Jade.

                                                           ***

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Sobre o Blog

" História de uma docete é apenas um blog que dá asas a minha imaginação. Cada personagem possui uma pequena parte de mim, independente se é boa ou ruim. Sempre abordo o amor, o ódio, a dor, o medo e a amizade quando escrevo algo, pois são fatores que estão constantemente presentes em nossas vidas. Acho maravilhoso abordar o que é recíproco ou não, e por isso, garanto que este blog será um cantinho no qual iremos nos apaixonar cada vez mais!"
-Emme